dig your own cave

Seja pelas constantes mutações, inversões e retroversões de estilo, seja pelos altos, baixos e tudo o que está no meio, seja ainda pela extraordinária capacidade de tão rápido lançarem um disco excepcional, como um perfeitamente banal, ou um apenas razoavelzinho, não haverá outra banda como os Cave In.
De banda preferida passam a gajos a quem me apetece dar um pontapé na cabeça, a ver se tomam juízo. Mas há que lhes admirar a garra e persistência. Talvez por isso eu lhes continue a dar a minha atenção, não só na esperança que eles regressem à boa forma (seja como space-rockers, como metalheads emperdenidos, ou como bem lhes aprouver. É-me indiferente como o fazem), mas, principalmente, porque qualquer novo disco dos Cave In é sempre uma surpresa. Uma incógnita. Pelos melhores ou piores motivos.

Se bem se recordam, os Cave In anunciaram recentemente o término de um hiato de três anos e meio, tendo voltado às lides discográficos à uns dias atrás, com o lançamento do EP "Planets of Old", EP esse que me fez recuperar a esperança num futuro radioso para a banda.
Por isso e por causa disso, aproveito para passar aqui revista à discografia (quase) completa da banda, numa viagem pontuada por subidas aos píncaros e descidas vertiginosas:

"Beyond Hypothermia" (1998, Hydra Head). O longa-duração de estreia, que não é mais do que uma compilação das primeiras gravações da banda. É o disco mais cru e primário da sua carreira. Metalcore bastante directo, sem grandes artifícios, floreados ou tecnicismos. Deveras interessante como documento da progressão da banda, mas, como obra isolada, está longe de ser extraordinário/revolucionário.
A ouvir: "Pivotal", "Flypaper", "Crossbearer", "Capsize" .

"Until Your Heart Stops" (1999, Hydra Head). Primeiro disco já com a formação emblemática (Stephen Brodsky, Adam McGrath, Caleb Scofield e JR Conners). A evolução desde os trabalhos patentes em "Beyond Hypothermia" é extraordinária (particularmente, a nível técnico), e a produção mais cuidada dá-lhe um brilho completamente diferente. Começa aqui a notar-se o gosto pela experimentação e a vontade de enveredar por caminhos mais arrojados, para além dos cânones tradicionais da música extrema, bem como o vincar de uma identidade muito própria. Continua a ser, quanto a mim, um dos melhores discos de metal de todos os tempos.
A ouvir: "Juggernaut" (sublime!), "Bottom Feeder", "The End of Our Rope Is a Noose", "Ebola".

"Creative Eclipses" (1999, Hydra Head). A minha versão do "Until Your Heart Stops" condensa este e o "Creative Eclipses" num disco único, mas não contém a "Sonata Brodsky", a última faixa do EP, muito provavelmente, por constrangimentos de duração - tinha-o gravado (completo) numa cassete, que actualmente não sei onde pára. "Creative Eclipses" é um marco histórico de transição estilística entre o barulho e a melodia, que fez a tacanhez engolir uns belos sapos (e.g. "Burning Down the Billboards" - que poderia ser Simon & Garfunkel no seu melhor - é uma autêntica pedrada no charco). Pela sua qualidade e pela forma extremamente elegante e conseguida com que essa transição é feita, ganha automaticamente o estatuto de obra-prima, mesmo tratando-se de um EP.
A ouvir: "Luminance" (a segunda mais bela canção de love & loss de sempre), "Burning Down the Billboards".

"Jupiter" (2000, Hydra Head). Este é 'O' disco da carreira dos Cave In. Se "Until Your Heart Stops" era a obra-prima por excelência da sua fase metalcore, este será a obra-prima por excelência da fase space-rock. Dá continuidade ao caminho trilhado em "Creative Eclipses" e é virtualmente irrepreensível, do início ao fim.
A ouvir: "Big Riff", "Innuendo and Out the Other", "Jupiter", "New Moon".

"Moons of Jupiter" (2001, The Magic Bullet). EP de reinterpretações de algumas das faixas de "Jupiter". Curiosamente, os quatro temas eleitos são os meus preferidos do supracitado "Jupiter". Ainda assim, estas reinterpretações - três das quais são versões ao piano (podiam perfeitamente integrar um dos discos a solo de Stephen Brodsky), sendo a outra uma remistura de "Jupiter", muito idêntica ao original - não acrescentam nada de novo. Não passa de uma curiosidade na discografia dos Cave In.
A ouvir: tudo, mas apenas por curiosidade ou completismo.

"Lost in the Air/Lift Off" (2002, Hydra Head). Por esta altura já se sabia que os Cave In tinham assinado pela RCA. Este "Lost in the Air" seria o primeiro single a ser retirado do disco de estreia na major, não augurando nada de bom. Tema medíocre, algo azeiteiro, que, a ser uma amostra fiel do resto do álbum, deixava muito a desejar - a versão patente neste single é algo diferente da final, mais polida (leia-se, mais 'árvore de natal'). "Lift Off" eleva a fasquia, mas não viria a fazer parte do alinhamento de "Antenna".
A ouvir: tudo. São só duas faixas, não custa muito.

"Tides of Tomorrow" (2002, Hydra Head). EP de despedida da Hydra Head, que recupera algum do brilho de glórias passadas, mas que, por outro lado, tem alguns momentos mais frouxos. Não é "Jupiter" nem "Antenna". Não é carne nem peixe. Não é bom nem mau. Apenas razoável.
A ouvir: "Dark Driving", "The Calypso", "The Callus".

"Antenna" (2003, RCA). É o disco do descalabro. O primeiro e último que a banda gravou pela RCA - por muito que digam que foi o que melhor vendeu da discografia dos Cave In, a breve incursão pelo mundo das majors não deve ter corrido nada bem. Não sendo necessariamente mau, é tão banal, azeiteiro e rockzinho de estádio, que chega a ser uma dor de alma ter que o ouvir. A espaços, faz lembrar um misto de Oasis e Incubus. O que nunca foi uma coisa boa. Apenas a guitarra-trademark de McGrath e a bateria de Conners conseguem, pontualmente, resgatar "Antenna" da mais profunda miséria.
A ouvir: com muito boa vontade, "Rubber and Glue", "Stained Silver", "Anchor", "Inspire".

"Perfect Pitch Black" (2005, Hydra Head). Se "Tides of Tomorrow" era o disco de despedida, "Perfect Pitch Black" marca o regresso à Hydra. Não sendo um regresso em grande forma, melhora um pouco relativamente ao álbum anterior. Ainda se notam aqui muitos tiques do "Antenna", mas nota-se também o desejo de cortar as amarras de um passado menos feliz. Os pouco mais de quatro minutos de "Trepanning" fazem-nos respirar de alívio e recuperar a esperança. Para além disso, há mais uns dois ou três pontos de interesse, mas nada de extraordinário. É um disco engraçadote, e pouco mais.
A ouvir: "Trepanning", "Off to Ruin", "Droned", "Screaming in Your Sleep".

"Planets of Old" (2009, Hydra Head). Após o lançamento de "Perfect Pitch Black", Conners vê-se forçado a abandonar os Cave In (recordo-me vagamente de ter lido na altura que ele teria partido um braço, ou uma perna, ou algo por aí), tendo Ben Koller, dos Converge, tomado o seu lugar. Depois disso, McGrath é noticiado como ex-guitarrista da banda. No culminar desta rota descendente, a banda anuncia oficialmente a cessação temporária de funções, em Novembro de 2006. Não sei se o interregno lhes terá feito bem, mas o facto é que regressam cheios de força com este "Planets of Old". Talvez ainda não seja Cave In no pleno domínio das suas capacidades, mas está quase lá. E sim, podemos dizê-lo, é um grande EP! Mais agressivo, mais back to the roots. Segundo Brodsky, em entrevista ao NoiseCreep, quase todos os temas são a cara de um dos elementos da banda: "Cayman Tongue" é Scofield chapado, "The Red Trail" é McGrath e "Air Escapes" é ele próprio, com uma pitada de Conners. Ainda assim, o resultado final é nada menos que coeso.
O mais extraordinário, para além de tudo isto, é que os Cave In fizeram-no, mais uma vez, sem repetir a fórmula. E isso, meus amigos, é insubstituível... É-me indiferente como eles o fazem, desde que o façam bem feito!
A ouvir: tudo.

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